quarta-feira, 14 de abril de 2010

CIBERCULTURA
(a partir da obra Cibercultura, de Pierre Lévy)
  
  
     Cibercultura e ciberespaço são dois conceitos sem os quais dificilmente poderemos caracterizar a sociedade em que vivemos actualmente. De forma muito directa, o próprio Lévy os define do seguinte modo: «Ciberespaço (que também chamarei de “rede”) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo significa não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo “cibercultura”, especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço.». O vídeo que se segue ajuda-nos a compreender bem o que as palavras de Lévy significam e são um bom ponto de partida para a análise que se segue.
  
  
     Analisemos um pouco mais o que está envolvido nestes dois conceitos. A sociedade actual está indissociavelmente marcada pelo uso da tecnologia em quase todos os aspectos da nossa vida, seja do simples telemóvel que ligamos todas as manhãs para estarmos conectados com o resto do mundo, seja pelas operações bancárias que efectuamos com o cartão electrónico ou a partir de casa, pela internet, seja ainda por complexas cirurgias médicas que nunca poderiam ser realizadas sem o advento da tecnologia. Por si só, a tecnologia não constitui o ciberespaço, mas a utilização que fazemos dela para o estabelecimento de vastíssimas redes de comunicação, que nos põem em contacto virtualmente com qualquer pessoa em qualquer lugar do universo, isso, sim, já define o ciberespaço. É nesse espaço que se desenvolve a cibercultura.
    
     A forma de agir e de pensar da humanidade mudou drasticamente com o aparecimento do ciberespaço. O conhecimento passou a estar marcado pela cooperação e pela interactividade, ou seja, por aquilo que Lévy chama de inteligência colectiva. O indivíduo passa a estar directamente envolvido no processo de construção do conhecimento, numa lógica de rede em que cada ponto contribui para a construção do todo, todo esse que está em constante mutação. Aquilo que hoje é considerado válido rapidamente é ultrapassado, e por ‘rapidamente’ entenda-se quase vertiginosamente. A construção do conhecimento, como já referido, processa-se de forma colaborativa, pois o ciberespaço disponibiliza sistemas de produção colaborativa que permitem essa forma construir a cultura – veja-se o exemplo da Wikipedia (cf. ponto 1), das plataformas de aprendizagem (cf. ponto 2) e de todos os fóruns de dúvidas e de discussão existentes em que se dá apoio à construção do conhecimento, mesmo que seja para ajudar a usar um determinado software (cf. ponto 3).
    
Inevitavelmente, toda esta nova atmosfera tem implicações na educação. Não é possível fechar os olhos às transformações tecnológicas e a toda uma nova filosofia de vida, pois há toda uma nova maneira de procurar informação e uma nova lógica de leitura (através de hiperligações). Há também um novo espaço de educação proporcionado pelos ambientes virtuais de aprendizagem que são um bom exemplo do que o ciberespaço tornou possível.
    
Para ilustrar o que foi desenvolvido até agora sobre os conceitos apresentados na obra de Lévy, são apresentados agora três exemplos que considero significativos.
    
    
1. WIKIPEDIA
    
     Um exemplo que considero bastante significativo da cibercultura é a Wikipedia. Vejamos, inicialmente, como esta enciclopédia se descreve a si própria:
     «A Wikipédia é uma enciclopédia multilingue online livre colaborativa, ou seja, escrita internacionalmente por várias pessoas comuns de diversas regiões do mundo, todas elas voluntárias. Por ser livre, entende-se que qualquer artigo dessa obra pode ser transcrito, modificado e ampliado, desde que preservados os direitos de cópia e modificações (…). O modelo wiki é uma rede de páginas web contendo as mais diversas informações, que podem ser modificadas e ampliadas por qualquer pessoa através de navegadores comuns (…). Este é o factor que distingue a Wikipédia de todas as outras enciclopédias: qualquer pessoa com o acesso à Internet pode modificar qualquer artigo, e cada leitor é potencial colaborador do projecto.»
     Pelo indicado acima, considero tratar-se de um dos produtos mais destacado da inteligência colectiva de que Lévy fala, pelo seu processo de construção e pelo enorme sucesso que alcançou, tornando-se, efectivamente, uma das fontes de conhecimento e informação de maior relevo no ciberespaço. A frequência do Mestrado de Pedagogia do E-learning permitiu-me trabalhar pela primeira vez com wikis e isso despertou a minha atenção para este fenómeno surpreendente que é a construção partilhada da informação, em que cada um pode dar o seu contributo, ver as suas ideias aceites, rejeitadas e/ou complementadas por outros, até se chegar a um consenso colectivo, a um saber que não resulta de uma única entidade, mas de uma “inteligência colectiva”. O exemplo da Wikipedia vem mostrar que a cibercultura não é menos credível do que a anterior cultura escolástica e tradicional. Estas palavras são igualmente válidas para qualquer outro projecto de escrita colaborativa usando a tecnologia Wiki.
    
    
2. PLATAFORMAS DE APRENDIZAGEM – MOODLE
   
     As plataformas de aprendizagem, sendo o Moodle uma das mais utilizadas em Portugal, são também um exemplo muito ilustrativo da cibercultura. Note-se na definição apresentada na Wikipedia:
     «Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment (Moodle) é um software livre, de apoio à aprendizagem, executado num ambiente virtual. A expressão designa ainda o Learning Management System (Sistema de gestão da aprendizagem) em trabalho colaborativo baseado nesse programa. (…) Constitui-se em um sistema de administração de actividades educacionais destinado à criação de comunidades on-line, em ambientes virtuais voltados para a aprendizagem colaborativa. (...) Não só trata a aprendizagem como uma actividade social, mas focaliza a atenção na aprendizagem que acontece enquanto construímos activamente artefactos (como textos, por exemplo), para que outros os vejam ou utilizem. É desenvolvido colaborativamente por uma comunidade virtual, que reúne programadores e desenvolvedores de software livre, administradores de sistemas, professores, designers e usuários de todo o mundo.»
     Logo a forma como o projecto nasceu e tem vindo a ser desenvolvido é, por si só, um exemplo de cibercultura, uma vez que pois há uma comunidade virtual que colabora no seu desenvolvimento, resultando desse esforço comum um produto que se tem revelado um instrumento fundamental na educação à distância. Além disso, o uso desta plataforma de aprendizagem tem contribuído para o enriquecimento cultural de uma enorme comunidade internacional que se movimenta no ciberespaço. Trata-se daquilo que Lévy chama de «dispositivos de ensino em grupo (…) especialmente projectados para o compartilhamento de diversos recursos computacionais e o uso dos meios de comunicação próprios do hiperespaço» (página 101). Nós próprios, enquanto alunos do Mestrado de Pedagogia do E-learning, estamos a construir parte da nossa cultura pelos fóruns de discussão existentes na plataforma, pela partilha de informação que esses fóruns e outras ferramentas permitem. Comunicamos com colegas e professores, reorientamos a nossa aprendizagem e métodos de trabalho, tudo a partir deste espaço virtual. Trata-se, na prática, da construção de groupware referida por Lévy.
    
    
3. SOFTWARE OPENSOURCE E FÓRUNS DE APOIO
    
     O desenvolvimento de software livre é, do meu ponto de vista, um outro exemplo de cibercultura. Num mundo em que o domínio de competências informáticas passou quase a ser uma espécie de segunda língua, sem a qual não se pode sobreviver no ciberespaço, a disponibilização de software livre é um meio facilitador de integração. Em qualquer momento, podemos recorrer ao ciberespaço e encontrar um software livre que nos permita aceder a informações ou tornar-nos criadores de informação. Por exemplo, se quisermos criar um objecto de aprendizagem em PowerPoint e torná-lo disponível no Youtube, precisamos de uma ferramenta de conversão para vídeo. É só procurar num motor de busca o tipo de software desejado e aparecerão ferramentas livres, criadas muitas vezes de forma colaborativa em comunidades virtuais, frequentemente acompanhadas de fóruns de discussão e apoio à sua utilização. Não é preciso frequentar um qualquer curso ou adquirir um qualquer programa. O ciberespaço dá-nos tudo o que precisamos e enriquece-nos culturalmente, do ponto de vista informático.

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